Banalidades, aleatoriedades, inutilidades, letras de música que não viraram música e alguma poesia

sábado, 19 de dezembro de 2015

Sobre a reprodutibilidade

Walter Benjamin falou sobre isso. Ele falava na perda da "aura" da obra artística na era da reprodutibilidade. Ele escreveu sobre isso bem no auge da expansão do cinema e no momento em que a fotografia já estava consolidada como uma nova forma de arte e expressão humana. Deveria reler esse texto, mas agora tenho que escrever sobre ele. Paradoxo. Fico com o que me lembro. 
O quadro da Monalisa está no Museu do Louvre, na França. Nunca o vi e talvez nunca o verei pessoalmente. No entanto já o vi tantas vezes que ele já se tornou parte do meu e do imaginário de quase todas as pessoas que habitam este mundo. Paradoxo da reprodutibilidade. Vi mas não vi.
Em uma dessas revistas semanais (Época, Istoé, não me lembro qual foi) havia uma matéria sobre uma exposição de Van Gogh. A imagem que abria a matéria era uma reprodução do quadro "A Noite Estrelada". Uma coisa linda. A legenda da imagem da revista chamava atenção exatamente para o fato de que ela era uma reprodução e de que nenhuma tecnologia poderia substituir a experiência de estar ali, em frente daquela imagem e ver o maravilhoso efeito e vida que as combinações e fluências de cores do quadro proporcionam. Ou seja, a reprodução não é, nem nunca será, a coisa em si.
Da mesma forma pode-se pesquisar na Internet e facilmente encontrar a imagem do quadro de Van Gogh (com inúmeras qualidades de reprodução, algumas até alterando a qualidade de tonalidades) e depois colocá-la como plano de fundo da área de trabalho do seu computador. Uma boa ideia, vou fazer isso. No entanto será sempre uma reprodução, nunca a original. A aura foi perdida. Em troca disso, ganhamos o acesso a ela. Paradoxos. 
Algo mais ou menos parecido aconteceu com a invenção da prensa por Gutenberg que tornou possível a reprodução mais rápida (antes feita manualmente por monges) da Bíblia. A consequência, na época, foi a Reforma Protestante, que não por acaso, protestava a liberdade de interpretação da palavra divina.
Democratiza-se a liberdade de interpretação que, naturalmente, qualquer produção humana possui. No entanto, ao mesmo tempo, não a possuímos mais. A não ser como símbolo.
Tenho colada no meu contrabaixo a famosa imagem de Marilyn Monroe na qual ela tem sua saia levantada pela ventilação do metrô de Nova York. Cena icônica do cinema. Para mim, entre outras coisas, fundamentalmente ela representa o desvelamento de uma verdade que existe e é desejada e que se mostra, não por completo, apenas em sua latente possibilidade. Como é natural das imagens, essa interpretação ultrapassa o sentido original. Andy Warhol se apossou dessa possibilidade, fatiou e esquartejou Marilyn em muitas, infinitas Marilyns. Tornou, também, verdade em verdades, infinitas e múltiplas. No entanto, sempre iguais. Reproduzíveis. Verdades industriais, embaladas a vácuo e prontas para consumo.


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