Banalidades, aleatoriedades, inutilidades, letras de música que não viraram música e alguma poesia

sábado, 6 de abril de 2013

Intervalo


Depois de três quase intermináveis aulas eles se reencontram no intervalo. Tempo quase suficiente para tomar um café fraco, caro e cretino na cantina, dar uns beijos e amassos entre uma tragada e outra de cigarros made in Paraguay.
Ela começa:
− Te amo.
− Aham.
− Como assim "aham"?
– Como assim o quê?
– Tu não me ama?
– Aham.
– Então porque fica aí como um idiota repetindo "aham"?
– Sei lá... é só isso que tu tem pra me dizer?
– Quer dizer que não eu posso dizer que te amo? Porra, se é uma das coisas mais sublimes que uma pessoa pode dizer pra outra! Tu ainda fica reclamando!
– Não sei... acho que as palavras perdem alguma coisa quando são muito usadas. Já não significam mais o que eram.
– Tu e tuas teorias idiotas.
– Vai dizer que não é? As pessoas falam "te amo" pra mãe, pra vó, pro namorado, pras amigas, pros amigos, pro cachorro, pro gato, pro papagaio. Pro diabo a quatro! Isso umas 500 vezes por dia! Se bobear dizem "te amo" até pro carteiro que simplesmente tá fazendo o serviço dele trazendo o Sedex. Acho que deviam inventar outra palavra para o amor.
– Tu é um chato, isso sim.
– Aham.
Ele diz isso e sai, se afastando dela, enquanto que com um ágil movimento dos dedos médio e polegar atira a guimba de cigarro longe.
– Péra aí! Aonde tu vai?
– Voltar pra aula.
– Mas ainda não terminou o intervalo.
– Tá quase.
– Me escuta! Eu só queria que tu soubesse que eu te amo. Só isso. Tu não acredita em mim?
– Quero acreditar. Mas quando se repete uma coisa tanto, fica parecendo aquela teoria do Goebbels. Tá ligada? Uma mentira repetida 1000 vezes se torna verdade e tal. Mas continua sendo uma mentira.
– Então o que mais tu quer que eu diga?
– Desculpa, eu também não sei...
Eram 10h30. Fim do intervalo.




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